sábado, 6 de abril de 2013

A FORMIGA BOA – MONTEIRO LOBATO



            Havia uma jovem cigarra que tinha o costume de chiar ao pé dum formigueiro. Só parava quando cansadinha; e seu divertimento então era observar as formigas na eterna faina de abastecer as tulhas.
            Mas o bom tempo afinal passou e vieram as chuvas. Os animais todos arrepiados passavam o dia cochilando nas tocas.
            A pobre cigarra, sem abrigo em seu galhinho seco e metida em grandes apuros, deliberou socorrer-se de alguém.
            Manquitolando, com uma asa a arrastar, lá se dirigiu para o formigueiro. Bateu – tique, tique, tique...
            Aparece uma formiga friorenta, embrulhada num xalinho de paina.
            -Que quer? – perguntou, examinando a triste mendiga suja de lama e a tossir.
            -Venho em busca de agasalho. O mau tempo não cessa e eu...
            A formiga olhou-a de alto a baixo.
            -E que fez durante o bom tempo, que não construiu sua casa?
            A pobre cigarra, toda tremendo, respondeu depois num acesso de tosse:
            -Eu cantava, bem sabe...
            Ah!... exclamou a formiga recordando-se. Era você então que cantava nessa árvore enquanto nós labutávamos para encher as tulhas?
            -Isso mesmo, era eu...
            -Pois entre, amiguinha! Nunca poderemos esquecer as boas horas que sua cantoria nos proporcionou. Aquele chiado nos distraia e aliviava o trabalho. Dizíamos sempre: que felicidade ter uma vizinha tão gentil cantora! Entre, amiga, que aqui terá cama e mesa durante todo o mau tempo.
             A cigarra entrou sarou da tosse e voltou a ser a alegre cantora dos dias de sol.

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